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143 mortos

  • Stefano Nunes
  • Nov 15, 2015
  • 4 min read

143 mortos. Pessoas que saíram de casa não sabendo que não voltariam. Estavam dançando, bebendo, se divertindo, trabalhando. A única coisa que quase certamente não estavam fazendo era falar francês, por que todas essas mortes ocorreram no Brasil, a cada dia de 2014. Então se você acha que 153 mortos em Paris em uma só noite é um absurdo, muito bem, acertou, é mesmo. Palmas para você, não, sério, aplausos. *clap* *clap* *clap* *clap* *clap* *clap* pra cada um desses aplausos, morreu um jovem negro a 15 minutos da sua casa.


Enquanto uma empresa privada, por puro descuido, comprometia não só a vida de 7 pessoas (bem menos que 153 né, então importa menos, claro) como a fauna e a flora do vale do rio doce (olha só, coincidência) e da costa capixaba durante os próximos 100 anos.


Enquanto o rompimento de uma barragem deixava milhares de pessoas sem água, dois carros bomba explodiam a um oceano de distância. Dois carros bomba? Mas não era só um? Ainda não estou falando de Paris, mas de Beirute. Você provavelmente não registrou a notícia por que a) os veículos tradicionais de noticias não deram tanta ênfase b) você viu e não registrou por que viu as palavras Hezbollah e Líbano, e ligou o foda-se “é normal” de ver notícias 3) você está pouco se fodendo por que Beirute é uma cidade cheia de árabes e os árabes só sabem fazer guerra, se explodir e matar gente (você acha que estou exagerando com essa última, mas ela é a mais plausível).


Esse post é sobre o colonialismo. Essa palavra que você acha que merece estar em um livro de história, e que na verdade deveria estar zumbindo na sua orelha todos os dias. É a palavra que deveria vir à sua mente quando você acha bonito cabelo liso e não cabelo crespo. É a palavra que deveria gritar no seu ouvido quando você acha estranho comer mangaba, cagaita ou umbu, mas enche seu carrinho de supermercado de maçã, pêssego e cereja. Colonialismo é você achar que pessoas com pele branca importam, e pessoas de pele escura não existem.


Quantas vezes você mudou sua foto de perfil do Facebook para mostrar solidariedade com o Nigerianos vítimas do Boko Haram? E os Libaneses que morreram no dia 12 de novembro, um dia antes de Paris? E as 343 pessoas que morreram em São Paulo nas mãos da Polícia?


A França sempre foi campeã em colonialismo, e o Brasil em ser colonizado. Adoramos dar a nossos filhos nomes como Anderson, Wellington, Robson, Layde, Kelly. Sonhamos com coisas importadas, casa em Miami, consumimos séries americanas, cagamos para a novela (coisa de pobre, especialmente agora que apela pra classe C), queremos sempre mais pessoas brancas, com olhos verdes nos dizendo que o que é bom mesmo é ser negro e usar turbante. (Quando pessoas negras dizem isso você não fez nada, óbvio, como já disse, você as tornou invisíveis, inexistentes).


A França, que é um país altamente decadente, com pouca relevância cultural e política em um mundo de cooperações sul-sul, conseguiu um feito que poucos países conseguiram depois da segunda guerra mundial. Ela conseguiu existir. O pior é que até para nós, Brasileiros, a França existe mais do que o Espírito Santo e Minas Gerais e certamente mais do que a Síria, o Mali, a Nigéria e o Líbano. Por que você estima que o atentado em Paris em 2015, em Londres em 2007, ou em Nova York em 2001 são mais importantes que os atentados DIÁRIOS que vêm

acontecendo em Bagdá desde 2004? Mais de 18000 pessoas morreram no Iraque em 2014, ou as 50 000 pessoas assassinadas no Brasil, com cerca de 30% na mão da polícia (terrorista não carrega sempre alcorão). Cadê filtrozinho da bandeira do Iraque no Face? Cadê um dispositivo diário no Facebook para moradores da Maré se marcarem como seguros? Em um mundo de tragédias, choramos mais por crianças mortas em uma escola nos EUA do que por uma escola bombardeada por um drone no Afeganistão. Bombardeada por um robô, pilotado via videogame, por um soldado empregado por um Estado, um Estado que admiramos por seu respeito à democracia. (podemos aplaudir de novo? *clap* *clap* *clap*).


Você acha que o atentado na França é mais relevante, mais chocante, mais insultante à humanidade por que a França é um país civilizado. Afinal, você usa esse exemplo todos os dias falando dos ônibus na Europa, dos serviços públicos, do hospital, etc. Você está chocado, por que você é colonialista, e você acha que em países como o Iraque, a Síria, a Nigéria e o Brasil, o sofrimento das pessoas é normal. Você estima que esses acontecimentos são tão pouco relevantes que você olhou meus números absurdamente grandes 18 000, 250 000, 58 000, e você nem fez caso. Stalin já sabia disso antes de aprender a Tuitar. 153 mortos é uma tragédia, 58 000 é um post compartilhado no Face.



Stefano Nunes

 
 
 

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