Testemunho: Eu, mulher trans
- Ariel Pimenta
- Aug 14, 2017
- 3 min read
Pra mim, ser uma mulher trans é sempre estar em luta com o mundo e principalmente consigo mesma! Porquê a disforia, a falta de auto estima e amor próprio nos é imposta uma vez que estamos sempre à margem da sociedade, estamos sempre às escuras! Nunca temos alguém que esteja disposto a pegar na nossa mão e enfrentar o leão que é a nossa vida, e gritando para todo mundo: EU A AMO E ESTOU COM ELA!
A ideia de encontrar e vivenciar o amor é quase que uma fantasia de contos de fadas, a nossa fragilidade emocional é pesada e gritante! Sei que não é fácil ser quem sou, mas ser qualquer outra coisa que não fosse eu, seria mais difícil ainda!

Há um ano atrás eu fiz o meu primeiro ensaio fotográfico, onde a temática era algo mais sensual! A ideia e o foco principal era fazer eu enxergar a minha própria beleza, a beleza do meu corpo e da pessoa que eu sou; E no meio do caminho me ocorreu: “E se outras meninas como eu, sejam elas trans ou cis, também se sentirem inseguras com o próprio corpo?”. E foi aí que comecei a me empenhar tanto em ensaios em que o foco fosse meu corpo, não como uma forma de exposição, mas como uma forma de representatividade e motivação, que outras meninas se sintam a vontade em estar nuas ou em lingeries sexy... Por isso tenho em meu coração um agradecimento e amor incondicional pela fotógrafa Thais Tibery, que através de suas lentes e sensibilidade, me fez olhar para mim mesma com outros olhos!
Não vou mentir... Ainda me falta muito para aceitar, mas se eu, através das minhas fotos, frases, textos, depoimentos, puder fazer duas de dez garotas se sentirem melhores com a própria aparência, eu estarei realizada!
E por falar em realizações, recentemente consegui a averbação e o direito de retificar meu nome social e meu gênero em meus documentos, o que é uma conquista e tanto, sem falar que isso já é um passo bem largo para bem longe da realidade do submundo da prostituição que nos é imposta uma vez que ninguém quer nos contratar, ou respeitar nosso nome social, seja nos crachás, seja no uniforme, ou simplesmente verbalmente! O que nos faz correr para a única opção de emprego...
Pensar que eu consegui esse direito através de uma mutirão de retificação do nome social e gênero aqui em Brasília, e que tem acontecido em outros estados e cidades... Me faz sentir borboletas no estômago, imaginar que outras meninas e meninos trans estão cada dia mais próximos de se ter uma vida digna, me deixa muito feliz.

Toda essa luta para ser reconhecida socialmente vai muito além dos documentos, como também da leitura social e da odiosa “passabilidade cis’’ (aquela trans que é lida como cis), nós estamos em constante corrida para atingir padrões de feminilidade, as vezes nem por desejo e realização própria, as vezes apenas para passarmos despercebidas pela sociedade e sermos aceitas ou ainda mesmo não sofrermos agressões verbais, físicas ou até mesmos sermos mortas, afinal de contas... quem se mistura na multidão... sai ilesa!
A minha vivência, está muito distante da vivência da maioria das mulheres T, onde sou taxada como “uma trans com um grande nível de passabilidade cis” (como se isso mudasse o fato de eu ser trans na hora de ser pedida em namoro, ser apresentada aos pais de alguém, ou sair de mão dada no shopping). As mulheres cis no entanto me são muito gentis e amáveis, não sofro/sofri nenhum preconceito, discriminação ou transfobia por parte de nenhuma delas, apesar de ter como consciência de que o fato é que: Para muitas mulheres cis, o nosso desejo enquanto mulheres trans/travestis é ser como elas e que nunca iremos ser... (deixa elas continuarem achando isso rsrsrs) Apesar dos discursos transfóbicos muitas vezes vomitados por feministas radicais, sinto que a cada dia mais o movimento feminista, está nos entendendo e nos incluindo, mas como tudo em nossas vidas enquanto pessoas T, tudo é uma caminhada... Mas estamos caminhando, estamos nos inserindo, e estamos ganhando voz!
E as mulheres TRANS/TRAVESTIS, estão aí exatamente pra provar que ser mulher vai muito além de uma socialização ou de uma genitália, ser mulher é RESISTÊNCIA, é FORÇA, é DOÇURA NA AMARGUÊS e é estar provando a cada dia de nossas vidas que apesar de sermos subjugadas como inferiores, frágeis, incompetentes, QUE NÓS FAZEMOS A DIFERENÇA SIM.
Ariel Pimenta
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