Vida e morte
- Demerval Bruzzi
- Nov 22, 2015
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A única certeza em nossas vidas é a morte. No entanto esta certeza de data incerta ainda traz em sua espera as tristezas, neuroses, pânicos, e angustias difusas de sua realidade: “o fim”. No dia a dia se dispersa, aparecendo de forma romântica nos livros, teatros, filmes e novelas, que contrastam com a morte real e violenta das favelas, subúrbios oriundos das discrepâncias causadas pelas grandes metrópoles e suas proles aceleradas em busca de uma vida melhor. Paradoxalmente só percebemos o melhor da vida com a proximidade da morte...pois é exatamente frente a certeza do fim que damos valor aos pequenos momentos, aos atos simples como o olhar de uma criança ou mesmo o por do sol. Inúmeros autores abordaram a morte. Neste ensaio cito dois que mais me chamaram a atenção, Edgar Morin, e Philippe Ariès. Estando em uma extremidade, Morin com sua visão voluntária da morte livresca, literária, poética e filosófica, e na outra Ariès com seus estudo histórico. É realmente espantoso que diante de tanta tecnologia não se busca a compreensão deste fenômeno natural que tanto nos aprisiona. (ARIÈS, 2003), bem coloca quando diz ser surpreendente que as ciências dos homens, tão loquazes quando se trata da família, do trabalho, dos lazeres, da política, da religião, seja tão discreta quando o assunto é a morte. Seria o silencio da ciência responsável pela proliferação das crenças? Ou o surgimento das crenças advêm da necessidade de acalento frente ao fim da raça humana? Atribuir aos homens, ou melhor, somente aos homens a necessidade dos ritos necessários ao aceite da morte é uma inverdade, pois sabe-se que até entre os elefantes existem tais ritos, onde os vivos se esfregam nos restos mortais de seus mortos. Tais ritos devem ser entendidos como um acalento para aqueles que ainda vivem? Ou simples atos necessários a compreensão do fim da vida, ou ainda, simplesmente uma despedida do membro de nosso grupo social que um dia pairou sobre a terra em nossa companhia? Ainda no paradoxo da vida e morte, entendo que com a morte muitos ganham a vida, mas não vejo o contrário no meu dia a dia, ou seja, com a vida se ganhar a morte, muito pelo contrário, só se tem a morte com a falta da vida. Nem todos tem direito a vida, mas certamente todos vivos têm como certo sua morte. Nem sempre democrático é o rito intitulado como rito de passagem, ou simplesmente enterro. Durante séculos foi privilégio clerical e monástico acesso aos ritos de passagem, e somente após o século XVIII os então classificados leigos (por não serem pertencentes ao mundo do clero) passaram a ter acesso aos ritos de passagem por pressão da igreja, que com base no desconhecido, imputou ao homem o medo do além. Assim, surge a necessidade da prevenção. Prevenir-se do desconhecido, que para uns é a vida eterna, ao lado do “criador”, para outros um mundo de riqueza cercado por ouro e diamantes, ou ainda temos aqueles que acreditam que o paraíso é algo inigualável onde se é abençoado com uma vida de alegria; onde o ser humano nunca se sentirá miserável, suas roupas nunca se corroerão, e sua juventude nunca desaparecerá. O mais impressionante é que na visão religiosa, somente na morte se tem a beleza da vida. Não podemos entender como paraíso a visão do nascimento de uma vida? A exploração da ignorância da morte tem sido útil aqueles que pregam que na vida não se tem a real felicidade, e que riqueza só existe na vida eterna, após a morte. Não se pode duvidar do paradoxo vida e morte. Mas também não se pode imputar a riqueza como sendo antagônica a felicidade. As diversas crenças vêm ao longo dos séculos confundindo seus seguidores com promessas infundadas na verdade cientifica, com a esperança de um paraíso sem igual. Mesma crença que não aceita as diferenças inexistentes nos homossexuais, prostitutas, etc. Já que a vida é igual para todos com 24 horas, 1.440 minutos e 86.400 segundos. No fim, como em morte e vida Severina é na cova que terminamos nossos dias...é a cova a parte que nos cabe neste latifúndio. Com tantas idas e vindas, devemos entender que existe morte na vida ou vida na morte? Esta dúvida vai nos acompanhar até entendermos e aceitarmos que a morte nada mais é do que o fim da vida. Ampliada pelo egoísmo humano a morte toma parte de nossa vida com pré-ocupações desnecessárias e infundadas. O medo da morte não passa de um reflexo de nosso egoísmo frente a vida, onde de forma individual tememos por nossa extinção. Não de nossa raça, mas sim de nosso eu, de nosso ser, pleno mas egoísta em sua vida. Sentimos assim a morte do outro com medo de sentirmos a nossa própria morte. Mas a pior morte pode ser sentida, pois não extingue a vida. A pior morte fonte do egoísmo de nossa existência é a morte de nossa presença. Ë quando em vida, descobrimos que não mais existimos. É quando em vida percebemos que não mais somos uteis, não mais somos lembrados ou sequer notados. Não mais fazemos diferença, mesmo para aqueles que demos a vida. A morte da vida é assim, uma vida que por egoísmo ou medo pelo outro deixa de merecer ser vivida, ou passa a ter na morte a saída para uma nova vida. Concluo assim, que devemos viver a vida, até que chegue a morte e nos leve para uma vida melhor...
Prof. Ms. Demerval Guilarducci Bruzzi
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