Capricórnio: filosofia
- Bruno dos Santos Costa
- Aug 4, 2016
- 9 min read
“Quanto maior o número de leis, maior o número de ladrões.” – Lao Tzu
Ditador ou primeiro-ministro?
Capricórnio, nas estações, representa o começo do inverno, período no qual a vegetação e os animais se recolhe, hiberna, morre. No outono, colhemos os grãos e nos fechamos, preparados para o frio do inverno. Nesse momento, ou em algum momento em que o coletivo esteja sob alguma ameaça, cedemos o poder a uma autoridade que tomará as medidas necessárias – medidas frequentemente desagradáveis a nível individual.
Nesse sentido, Capricórnio representa tudo aquilo que é necessário para a sobrevivência – seja do indivíduo ou do coletivo, apesar de o coletivo ter prioridade. Capricórnio é o general que assume o poder num estado de emergência, o primeiro ministro que gerencia a nação e faz o que é necessário para protege-la. Vale lembrar que Capricórnio é aquele que irá garantir nossa sobrevivência. Os problemas começam quando o ditador decide permanecer até depois do inverno acabar.

Na metáfora capricorniana da montanha escalada pelo bode, podemos imaginar o bode vislumbrando a fartura taurina lá abaixo. Afinal, é o fato de sabermos que a primavera e o verão estão vindo que nos permite fazer os sacrifícios requeridos no inverno. Ora, lugar de bode é na montanha. A partir do que o momento que o tirano permanece além do estado de emergência, a repressão começa a se tornar maior e maior. Não é à toa que ‘inferno’ e ‘inverno’ são, foneticamente, praticamente a mesma palavra (a concepção que temos do inferno como um lugar quente é moderna – sintoma de que, numa cultura onde predomina a ciência materialista, o frio não incomoda tanto assim).
Infelizmente, a maioria dos cientistas políticos não soube diferenciar entre o 10-tirano e o 5-rei – uma confusão, inclusive, que aflige os próprios tiranos e reis. Para Thomas Hobbes, a função do Estado, acima de qualquer coisa, é de prevenir a anarquia – da mesma forma que o ‘superego’ existe como contraponto para a vontade pura do ‘id’. Em outras palavras, o poder repressivo é meramente o menor dos males – o velho conceito do “diabo que você conhece…”
Ora, é preciso saber valorizar a anarquia também. Se deixarmos o repressor capricorniano agir livremente, é só uma questão de tempo até que todos os cidadãos se tornem meras baterias que alimentam o Sistema. Isso acontece quando aquele que está em poder acredita que suas ideias (ou melhor, ideologias), seus métodos são os corretos, e não permite que nenhuma mudança ocorra. Ou melhor, quando os cidadãos não se desenvolveram a ponto de não precisarem mais de um Estado que controle todas as suas decisões – um desenvolvimento que precisa passar pelo conceito de que é preferível morrer a ser escravo.
As ditas ‘revoluções’ aquarianas são um produto inevitável da repressão capricorniana, afinal, é bastante claro que a Natureza está em constante movimento. A coisa ‘fica preta’ quando a 11-revolução castra o 10-ditador, somente para que o líder da revolução se torne um novo ditador. Não adianta querer estudar a Revolução Francesa sem buscar entender por que o período que sucedeu a Tomada da Bastilha foi posteriormente chamado de “O Terror”.
Em Capricórnio, não há individualidade, quanto menos individuação. É o uniforme, pouco importando o indivíduo que se encontra por trás do uniforme. Não há casos particulares: a lei, a regra se aplica igualmente para todos, e enquanto estamos na esfera do coletivo (9-Sag até 12-Px) é assim que deve acontecer. Mas quando chegamos no nascimento de Áries, é preciso começar a deixar pra trás noções de coletivismos e começar a focar na jornada heroica.
Um caso que mostra um Capricórnio muito mal passado é o ditador mais célebre do Século XX, Adolf Hitler, um homem que claramente não soube distinguir entre o coletivo e o individual. Esse conflito tem suas origens no posicionamento de Saturno na Casa X (duplicando o fator repressivo) e no signo de Leão, o ápice da individuação (não é à toa que Saturno está em exílio em Leão). Ou seja, para Hitler, saber sua etnia era conhecer toda sua individualidade.

Para que o 10-ditador permaneça no poder, é preciso que haja algum 7-inimigo do qual o 1-indivíduo irá sentir medo, ao melhor estilo 1984. É claro que a ‘escolha’ de Hitler dos judeus como inimigos da nação alemã tem todo um contexto histórico: após a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, judeus começaram a investir fortemente na Alemanha, vendo uma oportunidade de crescimento financeiro, afinal a Alemanha, naquele ponto, não tinha como piorar; à medida que os judeus foram se tornando mais importantes na política alemã, muitos germânicos se sentiam ameaçados pelos judeus, que afinal não eram originários da Alemanha, e foi justamente esse medo que Hitler explorou. No entanto, é curioso reparar que o signo do Descendente de Hitler é Áries, justamente o signo que representa o judaísmo (se tomarmos os signos de fogo como símbolos das principais religiões monoteístas – sendo Leão o cristianismo e Sagitário o Islã).
Dos astros mencionados acima, Vênus e Marte fazem quadratura ao Saturno de Casa 10, tornando a tarefa de integrar o 7-Outro particularmente difícil – um fato corroborado pela sua frustrada carreira de artista. Já que ele não pôde sublimar sua libido, criando arte que era genuinamente sua, essa energia acabou sendo divergida para Saturno (energia exacerbada pela conjunção da Lua e Júpiter em Capricórnio – sem nem mencionar as dificuldades causadas por Urano na Casa XII), convencendo-o de que um indivíduo pode ser resumido a suas definições superficiais – tornando não só todos os judeus em monstros gananciosos que extinguiriam a nação alemã, como também fazendo dele o grande herói salvador da pátria. O que Hitler não percebeu era que não era a pátria alemã que precisava ser salva por um herói – era ele mesmo.
Ética ou moralidade?
Uma das associações mais simples a se fazer com Capricórnio é às leis. O bode representa o Sistema, a estrutura necessária para a sobrevivência do indivíduo e da espécie. É por isso que o associaremos, mais adiante, ao superego, na perspectiva psicológica. Portanto, Capricórnio rege, de maneira geral, não apenas o governo mas toda a estrutura social que visa a manutenção do status quo. Por isso, podemos dizer que Capricórnio é não só a l/Lei, elaborada pelo governo e mantida pela polícia, como é também o olhar dado a alguém que ousa quebrar um tabu.
É claro que a natureza, e a Terra de maneira geral, estão em constante movimento, em eterno dinamismo. Resulta que aquilo que precisamos para sobreviver muda frequentemente, de acordo com as circunstâncias em fluxo do ambiente. É por isso que uma taxa alta de melanina na pele é vantajosa nos trópicos mas debilitante mais próximo dos polos. Por isso, o Sistema precisa de uma constante renovação, em pequenas medidas para que as defesas não montem bruscamente.
Esse ciclo é refletido nas relações entre Saturno e a Lua, os regentes dos opostos Capricórnio e Câncer. Saturno se move a passo glacial, precisando de +/- 29 anos para dar uma volta em torno do Sol, enquanto que dá uma volta na Terra em +/- 29 dias – essa sincronia não é acidental. Da mesma forma, a Lua progredida leva em torno de 27 anos para dar uma volta, mais uma vez refletindo o ciclo de Saturno. O Sistema, portanto, anda muito lentamente, sendo constantemente erodido pelas marés provocadas pela Lua.
A Lua se torna necessária pelo fato de que é da própria natureza do elemento Terra resistir a mudança, quanto mais o signo cardeal de Terra, Capricórnio, que é justamente o primeiro reflexo de endurecimento frente à mudança. Se deixarmos o bode tomar conta, tudo permanecerá do jeito que está para sempre. Nesse sentido, começa a ficar claro por que o signo de Câncer tem esse nome – é a 4-mutação na 10-estrutura.
Podemos então fazer uma distinção entre os conceitos de ‘ética’ e ‘moralidade’, atribuindo-os, respectivamente, a Capricórnio e Câncer. A 10-ética é o conjunto de normas, implícitas ou explícitas, que foram adotadas visando a preservação do coletivo. No Velho Testamento, Moisés subiu a 10-montanha e voltou com os 10 Mandamentos – as leis a ele pronunciadas por 9-Deus. Vejam que não é por acaso que tais leis estavam gravadas na 10-pedra.
Toda lei, no entanto, necessita de uma eventual adaptação às circunstâncias mutáveis. Tomemos o exemplo do 6º Mandamento: “Não matarás.” Qualquer um pode entender a necessidade de tal regra para a manutenção da sociedade civil – lembre-se que o objetivo de Capricórnio é evitar a anarquia. Ora, poucos hesitariam em matar alguém que estivesse ameaçando sua família. Aí que entra nosso conceito de 4-moralidade: aquela noção profunda (Câncer é do elemento água, o sentimento) do que é certo ou errado. Esse sentimento é a soma de todo nosso ser, unido no inconsciente, agindo atemporalmente sobre a consciência.
Para se manter o sofrimento desnecessário – uma distinção muito importante – no mínimo possível, é preciso que haja tanto ética quanto moralidade. Precisamos saber respeitar a decisão do coletivo mesmo quando ela nos prejudica pessoalmente, mas ao mesmo tempo precisamos ter coragem para desafiar aquela lei que sentimos ser injusta. Não podemos esquecer que a tendência do Sistema será sempre a autopreservação, através de um controle absoluto das circunstâncias, o que significa que devemos estar sempre questionando o Sistema, mesmo quando já (achamos que) sabemos a resposta.
Por que então essa ênfase no sofrimento ‘desnecessário’? O capricorniano mais famoso dos últimos dois mil anos nos lembra que às vezes um pouco de sofrimento cai bem, sobretudo quando ampliamos ao máximo nosso conceito de a/Amor (o algarismo romano para 10 – X – é uma cruz). Se não sofremos, não mudamos. Repare que, do ponto de vista material, parece que há uma relação entre a distância ao equador (e portanto a rigidez do inverno) e o avanço tecnológico e social de uma sociedade. É justamente o frio do inverno que nos faz 10-trabalhar – se a natureza me dá tudo que preciso, pra que vou correr atrás de qualquer coisa?
Felizmente, não existe resposta pronta para como reagir em cada situação. Se soubéssemos sempre quando dar voz à ética e quando dar voz à moralidade, não estaríamos fazendo escolha nenhuma, efetivamente desperdiçando nosso livre arbítrio. O universo nos provê com oportunidades de escolhermos entre o certo e o errado todo dia, e para isso nos resta refinar a escolha entre o que 10-deve ser feito e o que 4-precisa ser feito.
É aconselhável, portanto, àquele/a que tem uma ênfase planetária grande em Capricórnio (ou na Casa X ou de Saturno) que preste bastante atenção ao sentimento que vem do 4-estômago, pois sua tendência natural será de escolher o dever – sejam por quem seja ditado esse dever. O que devemos manter em mente é que muitas vezes o dever é algo que herdamos mais do que algo que escolhemos – seja de nossos pais, de nossa cultura ou de nossa nação. As leis de nossos pais funcionavam (ou não) em seu tempo – agora que é seu tempo, novas leis são necessárias.
A carreira: autodefinição vs. autoconhecimento
Dentre todos os assuntos possíveis, talvez o mais frequentemente abordado em consultas seja a ‘vida profissional’ ou ‘carreira’ (OK, OK, os ‘relacionamentos’ têm algo a contestar aqui). O que muitos não percebem, no entanto, é que, ao buscar uma 10-carreira, estamos geralmente correndo atrás de algo que nos disseram ser certo – mas que pode não ser. Capricórnio vir ‘antes’ de Áries, no movimento planetário anti-horário, nos indica que devemos dar uma volta por todo o zodíaco antes de retornar ao ‘útero’ – não adianta querer engatinhar de volta.
É preciso portanto que fique bem nítida a distinção entre a autodefinição e o autoconhecimento – o conhecimento é um assunto dos signos de Fogo, não de Terra. Consideremos nossa vida como uma escultura. O escultor, inicialmente, tem uma ideia da obra que irá realizar, e para tanto adquire um bloco da pedra que irá esculpir. Para tanto, pode definir a obra: terá tal tamanho, será sobre tal assunto, etc. No entanto, não adianta nada definir a obra: é preciso talhar a pedra, e somente quando a escultura está pronta podemos dizer que temos um verdadeiro ‘conhecimento’ dela.
Portanto, você me dizer que é médico me dá uma vaga definição sobre quem você é, mas não me dá a menor noção de quão bom você é como médico, quão empático, quão hábil, etc. O fato de ser médico não o distingue dos outros 100.000.000 de médicos no mundo, apenas me dá uma vaga ideia de suas inclinações.
Pouco importa a dificuldade da escalada de uma devida montanha: ao chegar no topo, o bode sempre irá ver a alguma distância uma montanha maior ou mais difícil que pode escalar. O que é importa é o que o bode aprendeu nessa devida escalada, e o que ele vai fazer com esse novo conhecimento. É justamente a escalada que é sua própria recompensa. Milhões de pessoas ao redor do mundo escalam pedras e montanhas, mas até um preguiçoso não veria muita graça em pegar um helicóptero até o cume.
No romance Tropas Estelares, de Robert A. Heinlein, o professor e futuro comandante do protagonista o diz para imaginar um cenário: ele treinou para uma corrida, queria muito ganha-la, mas chegou em quinto lugar; em seguida, alguém o entrega um troféu de primeiro lugar. Como ele se sentiria? O que aquele 10-troféu representaria para ele, senão o fracasso?
Um diploma, da mesma forma que um troféu, não nos diz nada sobre seu detentor. O fato de eu ter um troféu de campeão não significa cada – poderia simplesmente ter comprado um, ou ter sido o pior membro de um time bom. Nada disso nos define como indivíduos, serve apenas para criar a ilusão de que temos essa ou aquela característica. A pergunta de 1 milhão de reais é: essa ilusão serve para enganar os outros, ou para enganar a nós mesmos?
Ninguém aqui está argumentando que devemos nos livrar dos diplomas e dos troféus. Afinal, precisamos de um mínimo de garantia antes de deixarmos alguém enfiar uma agulha em nós. O que queremos enfatizar é que Capricórnio é o começo de uma descida, não de uma subida. Em nossa leitura ao menos, o bode representa aquilo que ainda não foi realizado, e é apenas através da vivência que poderemos realizar nossos potenciais inatos indiferenciados.
Por isso dizemos que carreira não traz felicidade, ela traz apenas estrutura. Nos definirmos como profissionais tem seu papel na vida, mas não está ligado necessariamente a um sentimento de realização ou felicidade. Nossos (pré)conceitos não necessariamente se encaixam em nossa realidade atual, daí a necessidade do bode questionar o valor da montanha que sobe, e de se perguntar se é realmente a escalada que o define como bode.
Bruno dos Santos Costa, astrólogo
Fonte: https://erisastrologia.wordpress.com/capricornio-filosofia/
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